quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

O HINÁRIO EVANGELICO JÁ MORREU?

Hoje vivemos um grande dilema em usar ou aposentar os hinários dos nossos cultos. Na realidade, não podemos negar que o hinário evangélico teve sua importância nos primórdios do metodismo e também de outras denominações evangélicas do nosso país, não só o hinário, mas, como também o Cantor Cristão, a Harpa Cristã e outros. A maior dificuldade hoje é modernizar o Hinário Evangélico, traze-lo para os nossos dias ou entender que uma época já passou.

ATUALIZAÇÃO
O hinário evangélico marcou a vida de muitas pessoas, e alguns hinos se tornaram clássicos mundiais. Mas será que a sua época já passou? Quase não se canta mais do hinário nas nossas igrejas. Na verdade, eu entendo que esta fatalidade se deu no momento em que nossos antepassados o tinham como intocável, idolatrado. Foi tão defendido que não podia de maneira alguma ser atualizado para as novas gerações. Por outro lado, vemos que até a bíblia passou por esta atualização, pois, hoje temos variadas traduções da bíblia como Linguagem de Hoje, Bíblia Viva, Bíblia do Peregrino, etc...
Desta forma os defensores do hinário não permitiram fazer esta atualização no momento certo, e hoje talvez seja até impossível de introduzir o hinário novamente, como no passado. Muitas destas pessoas ainda estão vivas nos dias de hoje, e eu pergunto: será que elas prefeririam agora assistir TV em um televisor preto e branco a válvulas, com aquela imagem trêmula ou em um televisor LCD FulHD totalmente digital? Pergunto também: andariam num FIAT 147 no lugar de um Fiat Pálio? Ou, navegariam na internet em uma máquina de escrever ou em um computador? Isto nos mostra que as coisas evoluem e até as pessoas precisam se evoluir e se atualizar, senão vão ficar para trás.
As músicas e as letras do hinário não sofreram nenhuma alteração, ou quase nenhuma desde a sua primeira edição, e por outro lado, os chamados “corinhos” foram de certa forma se atualizando e sobressaindo ao hinário, ganhando uma nova roupagem chamada de Gospel, ganhando espaço na gravadora e vendagem de disco de vinil, e num processo muito rápido chegou a CD, DVD e MP3 distribuído em toda a internet. Com isto houve um grande investimento no movimento Gospel na questão de instrumento e equipamento de sonorização de boa qualidade como as bandas seculares. Enquanto houve esta crescente no mundo Gospel, as músicas do hinário foram sendo deixadas de lado e caindo no esquecimento dos membros, e principalmente dos mais jovens.
Hoje nas igrejas tem praticamente dois grupos: os mais velhos que querem exigir que cantem o hinário e o mais jovens que querem cantar apenas as músicas mais contextualizadas para o nosso tempo. Eu discordo com alguns escritores como a Magali Cunha que escreve que o Movimento Gospel fosse a banda pobre dos evangélicos, pelo contrário, acho que o movimento e a musicalidade do Gospel colaborou e muito para a divulgação do evangelho nos tempos atuais e se criou muitas músicas que marcaram a vida do povo evangélico.

A TEOLOGIA DO HINÁRIO EVANGÉLICO

O Hinário Evangélico é completamente teológico, pois, surge mais em meio aos clérigos e não dos leigos. A teologia dos hinos do hinário tem a centralidade de Cristo Jesus, sendo o Senhor o centro de tudo e principalmente da nossa fé, o que é correto. Mas, além da centralidade de Cristo, podemos perceber a presença de hinos que exaltam do Espírito Santo na vida da Igreja como ensinador. Muitos hinos nos fazem meditar e nos desafiam à missão, a qual é responsabilidade de todos nós. Mas há algo que nos passa despercebido que é uma teologia celestial, isto é, que o crente só vai ser feliz mesmo no céu, só vai deleitar realmente de paz, prosperidade e gozo lá no céu, e que este mundo aqui não presta, isto é claro nas letras das músicas como no hino 211: “É do além, é do além... Doce canto já me vem! Quem me dera, se possível, deste mundo desprezível já partir ao Sumo Bem!”. Ou como o hino 213: “Cá sofremos aflição, as tristezas muitas são, mas lá no céu há paz”.
Outra teologia visível nos nossos hinários é a teologia do sofrimento, o qual é uma herança do lacaito, da Igreja Católica romana, de que quanto mais sofrimento, mais próximo de Deus a pessoa consegue estar, como se fosse um “masoquismo espiritual”, para mostrar a dureza desta vida, como vemos no hino 353: “Quanta dor, quanta amargura vem meu peito retalhar! Mas que importa, se diviso clara luz além brilhar! Nela cheio de esperança, cravo os olhos tristes meus; ela é selo de garantia do supremo amor de Deus”. Ás vezes com esta teologia tanto a celestial, como a do sofrimento, acabam deixando alguns hinos do nosso hinário meio melancólicos, como expressão da nossa fé.

A MUSICALIDADE DO HINÁRIO EVANGÉLICO

A musicalidade do nosso hinário é européia e americana. Os arranjos do hinário foram feitos para acompanhamento de um órgão apenas. Hoje em dia, qualquer igreja, seja ela pequena ou localizada em um lugarejo bem pequeno, você irá encontrar nesta igreja de instrumento, no mínimo uma bateria, um teclado, uma guitarra e um contrabaixo e dificilmente você encontra somente um órgão musical. Na verdade, o nosso hinário é um material de importação da Europa e dos Estados Unidos e não tem a musicalidade brasileira. Isto não tem jeito, pois, o brasileiro já nasce com um gingado muito diferente de qualquer outra nação, é só ouvir uma música genuinamente brasileira que logo começamos e mexer o pé, a mão e o corpo. Diante desta musicalidade brasileira, o movimento gospel ganhou mais adepto do que o hinário, pois, o hinário não passa de repetição dos mesmos hinos durante anos, década ou século. Já a música do movimento gospel está sempre em transformação e livre para se criar. Esta é a maior diferença entre os hinos do hinário e as músicas do movimento gospel: que o hinário contém 500 hinos praticamente intocáveis, enquanto que a música gospel está sempre no processo de evolução, e para melhor, tanto na letra como no arranjo.

Com tudo isto que foi explanado aqui, volto à inquietação da pergunta inicial: O hinário evangélico morreu? A reposta é o seguinte: O hinário está na UTI, respirando com a ajuda de oxigênio e o último cilindro de oxigênio acabando. Temos que decidir com coragem: achar uma forma de ressuscitá-lo ou deixá-lo morrer. Para isso temos que assumir a nossa musicalidade brasileira.

Pr. Orlando Carrafa dos Santos
Cachoeiro do Itapemirim-ES
03 Fevereiro de 2009

Nenhum comentário: