quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

TER PAZ COM DEUS


INTRODUÇÃO

O texto começa dizendo: “... justificados, pois, mediante a fé, temos...”— não é teremos e nem tivemos —“... paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo”. O interessante é que a promessa é algo que se existencializa no presente, e está falando de se ter paz com Deus já... agora...

Trata-se de uma fé que continua a ser fé, porque não nos oferece materialidades. Não é um joguinho de dados; não é uma crença animista, não é uma mecânica espiritual. Quando ela se instala, se instala como mistério, e, como tal, você não pode explicar, mas também não pode negar a presença de tal realidade em você.

Só que tudo isso começa nos remetendo para o texto anterior a este, porque o texto diz: “... justificados, pois,...” Ou seja: somos justificados por causa de alguma coisa. Assim, é como se Paulo dissesse: “É por causa do que eu venho falando que vocês estão justificados”.

O que Paulo vinha falando anteriormente era sobre Abraão, e de como Abraão foi justificado pela fé, não por obras da lei, nem pelo rito da circuncisão, nem por qualquer obediência que precedesse a sua própria justiça. Toda obediência que acontece em Abraão é obediência patrocinada pela pulsão da fé.

Ou seja: é essa fé que está presente nele de modo inexplicável, aquilo que Deus toma e transforma na própria justiça de Abraão; imputa justiça a ele, não porque ele seja justo, mas porque ele crêem Deus. Essa é a sua justiça, essa é a virtude que não é dele; ou seja: ele é feito virtuoso pela virtude que não possui; ele é feito virtuoso porque a própria realidade da fé é anterior a ele mesmo, e não é uma produção virtuosa dele próprio, visto que até a fé lhe foi dada.

Isto porque intelecto nenhum pode justificar a obediência em fé de um homem que atende a uma voz noturna que diz: “Abraão, pega teu filho, teu único filho, Isaque, a quem amas, e leva-o a um monte que te mostrarei; e ali oferece-o em holocausto a mim.” E Abraão se levantou e foi.

Paulo começa “essa viagem” no capítulo anterior, falando de como Abraão foi justificado pela fé, e diz que a primeira manifestação disso está no fato de que ele ouviu uma Voz na Mesopotâmia, creu, levantou, e foi... E o resto da vida ele caminhou ouvindo promessas que não se materializavam, ou algumas que se atrasavam para sempre, que só iriam se encarnar depois que todas as forças humanas dele tinham sido esgotadas de tal modo, que o filho que lhe é prometido só lhe é dado quando ele já não tem mais nenhum vigor para procriar, quando a própria esposa dele já não podia mais nem oferecer óvulos para procriação, porque tinha entrado na menopausa há muito tempo; mas ele creu o tempo todo no Deus que vivifica os mortos.

Abraão não é o nosso santo predileto, é apenas nosso irmão mais antigo na fé na ressurreição dos mortos!

1° Ponto:

GLORIEMO-NOS NA ESPERANÇA DA GLÓRIA DE DEUS

Paulo, na seqüência do texto, fala de três perspectivas de glória que essa paz com Deus produz em nós. A primeira é a esperança da glória de Deus: “... gloriemo-nos na esperança da glória de Deus”.

Por causa dessa obra que está feita, dessa paz que foi obtida, por causa dessa graça na qual estamos firmes pela fé em Nosso Senhor Jesus Cristo, por causa dessa certeza de total apaziguamento entre a minha alma e Deus, por causa da convicção total de que os meus débitos foram todos cancelados — Sim! Por causa disso tudo, eu posso entrar com cara limpa para além de todos os véus que já foram rasgados por Jesus. De modo que em Cristo, eu tenho acesso, com intrepidez, a essa graça na qual eu agora estou FIRME.

Agora, isso produz um sentimento de glória na gente. E que não é glória pessoal. Porque você não tem do que se gloriar, pessoalmente, nesse processo inteiro. Ou tem? Porque se você tiver, eu repito: você vai ter que se vestir das suas justiças próprias.

Mas se você confessa que não tem justiça própria e que a sua justiça vem da fé que foi dada a você, e confessa que tal entendimento veio pela iluminação do Espírito acerca do que Jesus já consumou a seu favor, então, você tem que ter paz com Deus. Não precisa ter medo de Deus. Pode andar distraído... Mesmo! E, aí, a primeira coisa que surge é esse sentimento de uma glória, onde você se gloria na esperança da glória de Deus.

É uma pena perceber que nós, cristãos, perdemos essa dimensão da eternidade em nós. Nósestamos tão massacrados pelo tempo e pelo espaço, e a religião se transformou num megafone que faz propostas e promessas de suposto cumprimento imediato, e que roubou do coração das pessoas toda fé na eternidade.

O que temos é corredor de sal grosso para você passar 30 vezes, e se passar bem passado, e frequentar a reunião da corrente dos empresários, ou se entrar em qualquer outro sistema, em qualquer outro “modus operandi” de mecânica espiritual, no fim, diz-se que você pode ter um carro novo, um apartamento ou qualquer outra coisa. Em outras palavras: a fé que usa do nome de Jesus, na maior parte das vezes, virou macumba. Virou despacho. Não tem mais Cruz, não tem mais sangue, não tem eternidade, não tem pacificação com Deus.

O que se tem agora é simplesmente consumo. E essa fezinha que está aí... é boa para você jogar na loteria, é boa para você jogar na Quina acumulada. Mas na hora em que o tranco da existência bate firme, bate forte e bate fundo na gente, ela não sobrevive, porque ela existe apenas por fazer a promessa de que se você cumprir determinadas coisas, alguns benefícios imediatos lhes serão garantidos; nada mais do que isso...

Agora, paz com Deus, tem que produzir em mim uma expectativa que transcenda o tempo, o espaço, o imediato, a violência, o estado de emergência, a crise familiar, as perdas imediatas, os lutos, as aflições.

Agora, eu pergunto a você: uma teologiazinha de prosperidade, que promete geladeira, Casas Bahia, Ricardo Eletro, Ponto Frio Bonzão, carro novo, tem o que para fazer no coração de alguém que acaba de perder as suas entranhas? Nada! A menos que você se glorie na esperança da glória de Deus! Aí, se você se gloria na esperança da glória de Deus, você não perdeu nada!

Paulo diz na seqüência do texto: “... quando nós ainda éramos pecadores”, estranhos, inimigos, alienados, sem saber de coisa alguma, Ele se reconciliou conosco, esperando apenas que a gente se reconciliasse com Ele para que nós usufruíssemos o bem que já nos está garantido. De tal modo que a minha reconciliação pela fé, não é o que faz Deus mudar de idéia a meu respeito. A reconciliação da parte de Deus já está feita, eu é que não sabia. Nem você. E, enquanto isso..., vivíamos no padecimento da neurose, da angústia, da fobia, da culpa, das trocas, das barganhas, do despacho, e de todas as aflições...

Sem falar que sem paz com Deus a vida passa a acontecer um permanente estado de suspeição contra os céus. “Será que alguma coisa aconteceu comigo? Ih, meu Deus! Eu perdi o Táxi. Será que é por que tem alguma coisa? Será que Deus está me preparando alguma?

É um sentimento de suspeição o tempo todo! O camarada chega ao aeroporto, na hora de pegar o avião, ele tem medo de que se aquele avião vá cair; ou se ele está ali e ele perde o avião, ele já interpreta aquilo: “Ai, graças a Deus, vai ver que é porque esse vai cair.” Não está nem preocupado com os 199 que estão lá dentro!

Sim, a maioria vive vida muito miserável. A gente vive, e a gente não se dá conta de como se vive uma vida de medo, medo, medo... o dia inteiro medo... medo de tudo.

Mas quando a paz com Deus se estabeleceu dentro de mim, o benefício é todo meu. Deus não ganha nada com isso, quem ganha sou eu. Já está feito, eu é que não sabia. Mas quando eu creio, o benefício vem para mim como paz. E ai, surge dentro de mim, uma dimensão completamente nova, que transcende o imediato. Eu continuo vivendo na terra, mas já me glorio na esperança da glória de Deus. Tá feito! E eu me glorio nessa esperança!

2º Ponto:

GLORIEMO-NOS, TAMBÉM, NAS PRÓPRIAS TRIBULAÇÕES

A segunda manifestação de gloria que essa paz com Deus gera na gente, que esse caminho de pacificação com Deus gera em nós, e que a maioria de nós não gosta. Isso porque Paulo prossegue, e diz: “... e gloriemo-nos, também, nas próprias tribulações”. Ai a gente diz: “Vira essa boca pra lá, pelo amor de Deus!”— e o camarada começa a fazer oração contra, inicia-se aquele processo de “tá amarrado”. Tem crente que lê Romanos 5, 2 e 3, dizendo: “Tá amarrado”. Tem gente que diz: “Eu não gosto dessa parte aqui... “tá amarrada”. Só que, meu amigo, você pode gritar “tá amarrado” o tempo todo, não está amarrado. Não a Palavra de Deus! Para o seu bem, não está amarrada!

Essa “vidazinha de fezinha” que nos promete falsas promessas, que seremos poupados de todas as coisas, porque agora a gente tem uma carteirinha de crente no bolso, e porque a gente frequenta uma sequência de reuniões não será jamais objeto e sujeito do sofrimento — porquanto se teria um domo invisível de proteção e de inatingibilidade sobre a cabeça —, é mentira, mentira, mentira; e eu diria: do diabo.

Isso porque a vida não vai tratar você assim. E quando a vida for o que ela é para você, você vai pensar que Deus enganou você; e quem enganou não foi Deus nem a Palavra dele. O responsável diabólico é esse “pacote de sedução falsa” que venderam para você em “nome de Jesus”.

E não adianta ficar dizendo “tá amarrado”, porque só fica amarrado aquilo que seja uma presença “alienígena” à existência humana. Mas aquilo que Deus determina, por mais estranho que pareça, faz parte de um processo de cura, de terapia, de crescimento, de aprofundamento da consciência em fé em mim, e não há mão humana que possa deter. Portanto, assim como você se gloria da esperança da glória de Deus, se glorie nas próprias tribulações.

O interessante é que, para nós, cristãos, quando a gente ouve falar em tribulação, quase sempre o nosso auto-engano nos leva a imaginar que tribulação é apenas aquele sofrimento que a gente acha que está sofrendo injustamente.

Tribulação para a maioria dos crentes é isso!

Tem um patrão chato, perseguindo; ou você se enganou e casou com a mulher rixosa e não sabia; tá preferindo trocar a mulher por uma goteira contínua na sua cabeça. Isso é tribulação de crente!

A tribulação é a vida! Seja quando você está certo, ou quando você está errado. Quando os outros cometem injustiça contra você, e, também, quando você comete contra os outros; intencionalmente ou não, conscientemente ou inconscientemente.

Tribulação é o caldo, é o produto, é o resultado, é a soma das contingencialidades, esse volume inteiro de coisas que estão para além do controle. Por isso, em outras palavras, o que Paulo está dizendo é que você se glorie na existência, em Deus. Não coloque nomes nas suas tribulações, porque o nosso auto-virtuosismo é tão grande que a gente só se sente atribulado quando a gente pensa — pela nossa própria justiça — que estamos sendo objeto de algum tipo de injustiça.

É obvio que Paulo não está recomendando que ninguém pratique o mal e se glorie acerca disso. O que ele está dizendo é que tudo aquilo que chega para mim na vida, e que, de algum modo, significa um susto, uma mudança, um toque que altera as coisas, e gera a presença de todos aqueles elementos que quando se aproximam da gente ou tocam na gente, fazem com que alguma coisa doa ou perturbe, ou tire o equilíbrio, ou mexa naquilo que a gente chamava de meu bem, e mexe a minha harmonia, é tribulação!

Paulo diz que se você está em Cristo e pacificado em Deus, a tribulação não tem o poder de fazer nada com você, a não ser de melhorá-lo. O mal perdeu o poder de se tornar maligno se você estiver com a sua consciência em Cristo, justificado pela fé e pacificado com Deus.

Mas, por outro lado, você não vai ser poupado de existir na vida, como ela é!

Gloriemo-nos, pois, nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz têmpera, produz perseverança, produz consistência, fortalece, treina, enrijece, produz densidade. Sim, cria dentro de você um ser que não é estéril; ao contrário, vai dando a você corpo, forma, densidade interior, olhar firme, perseverança e vai gerar experiência.

Experiência só tem quem experimenta. Quem não experimenta não tem experiência. Eu acho engraçado que os crentes acham que a gente pode ter experiência, sem experimento. Você pode até, não necessariamente, experimentar tudo, e Deus o livre de buscar todos os experimentos. Só o idiota busca o experimento como dor! Você não precisa buscar experimento ruim nenhum. Mas se a vida trouxer a tribulação, com a forma que vier, persevere. Porque nesse caminho, aquilo que era mal, vai se transformar em experiência, aonde o experimento não foi algo que você evocou, mas aconteceu; e, uma vez tendo acontecido, problema dele, pois vai ser processado em Jesus para o seu bem.

3° Ponto:

GLORIEMO-NOS EM DEUS

Olha a seqüência maravilhosa que Paulo faz: Primeiro ele diz: “gloriemo-nos na esperança da glória de Deus”. Em seguida diz: “gloriemo-nos, também, nas próprias tribulações” e por último: ‘gloriemo-nos em Deus”.

Eu conheço pouca gente que de fato vive esse benefício de apenas ser de Deus. A maioria quer fazer alguma coisa para Deus. Quer que Deus se glorie nele, não ele em Deus. É o tal do “Eu vou fazer isso aqui para agradar a Deus.”

E toda vez que eu faço alguma coisa achando que eu vou agradar a Deus, eu já caí no profundo desagrado. Porque as coisas que eu faço que agradem a Deus não são aquelas que eu premedito; elas são frutos de um amor que me constrange. E a palavra original para “constrange”, no Novo Testamento, é a mesma que procede da raiz de cólicas intestinais. Esse constrangimento que vem das vísceras. Quando bate, ninguém precisa pensar; sabe o que fazer. E o amor de Cristo chega assim com esse poder, ninguém fica na dúvida quando o amor de Cristo chega, a gente sabe. Ele é quem me constrange a ir...

O último estágio é quando a consciência em fé cresce e você se gloria em Deus mesmo. E eu peço a Deus, de todo o meu coração, que eu chegue um dia a existencialmente me gloriar em Deus, só por Deus. Porque conquanto eu tenha consciência disso, não basta ter essa consciência; isso tem que virar uma verdade que entrou em mim; e não sai mais.

Mas há de chegar a hora em que a minha glória será em Deus, por Deus e só por Deus, sem nenhum “mas”, pois tudo já será em Deus para mim. Então você diz: “O Senhor é a minha porção e a minha herança!” Nesse dia você serve a Deus por nada, absolutamente nada. Você não serve mais nem a Deus para ser salvo; não serve mais nem a Deus por causa da glória prometida; a herança se instalou como presente, você se gloria no Deus que é.

Não há aqui nenhuma promessa de isenção; o que há é a certeza de uma segurança total. Não importa o que venha, acaba o medo. Quando essa consciência chega para gente, o mundo se desassombra. Essa é uma coisa que, se crida, meu Deus, desemprega um monte de psicólogos e psicanalistas e pastores.

Justificado, pois, mediante a fé, temos paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo. Estamos firmes nessa graça e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus; e não somente isto: gloriamo-nos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança, a perseverança experiência, e a experiência esperança; e a esperança não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi outorgado. Amém!

Fonte: A Bíblia de Estudo Scofield – Almeida Corrigida Fiel- 2009, São Paulo, S

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